Para além de novembro: números do Judiciário mostram como iniciativas para população negra ainda não são suficientes

Nos últimos seis anos, das 386 denúncias de racismo e injúria racial no Ministério Público da Bahia (MP-BA), em apenas 89 houve sentença

A chegada do mês de novembro sempre constrói um panorama completamente diferente do normal: a cidade efervesce com grandes eventos que pagam corretamente os artistas negros; exalta a cultura que desde lempre luta por espaços; a televisão se enche de rostos negros em seus comerciais e programas; e os estudos sobre racismo bombam em todos os portais de notícias, que reservam 30 dias para dar luz a todo o acúmulo de pautas ignoradas.

Mas e nos outros meses? Quem olha e faz algo pela violação de direitos que a desigualdade racial alimenta e perpetua o projeto de genocídio da população preta? Os números não negam, nem deixam esconder, é preciso pensar em medidas de equidade e reparação para a população negra em todos os dias do ano.

Somente em 2023 a lei que tipifica injúria racial como crime de racismo entrou em vigor. Com a mudança, “injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional” pode gerar pena de reclusão, de dois a cinco anos, e multa. A demora para que o crime começasse a ser encarado como tal evidencia o atraso da Justiça brasileira e se reflete nos dados.

Os relatos e denúncias de pessoas negras que sofreram e denunciaram casos de preconceito são diários, mas poucos conseguem ir adiante. Entre 2018 e 2023, o Ministério Público da Bahia ofereceu um total de 386 denúncias por crimes de racismo e injúria racial. Dessas, somente 89 sentenças condenaram os denunciados. Ou seja, apenas pouco mais de 23% das vítimas saíram minimamente reparadas desses casos.

O panorama é um pouco diferente quando é feito recorte de vítimas negras de racismo nas redes sociais, mas não deixa de ser preocupante. Uma pesquisa, organizada pela Faculdade Baiana de Direito, Jusbrasil e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), mapeou e analisou casos julgados pelos tribunais brasileiros, entre 2010 e 2022, e revelou que a maioria deles (83%) resultou em condenações. No entanto, o levantamento ressalta que há no país uma cultura judicial de aplicação da pena mínima, o que contribui para que, nos últimos 12 anos, nenhum réu tenha sido condenado a cumprir pena em regime fechado.

Consciência

É preciso entender, dar ouvidos e espaços para as pessoas negras, desde suas dores às suas alegrias. Essa é a verdadeira Consciência Negra, que não se restringe, limita e existe somente no dia 20 de novembro. Nós somos, existimos e, sobretudo, resistimos o ano inteiro. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil. Metro 1.