Flica chega à 11ª edição e reverencia as poéticas afroindígenas

Festa é tida como a maior feira de literatura do Norte e Nordeste brasileiro

De uns poucos anos pra cá, boa parte das cidades baianas ganhou uma feira literária pra chamar de sua. Dentre todas, a Flica – Festa Literária Internacional de Cachoeira é, sem dúvida, uma das mais tradicionais e já festeja sua 11ª edição em 2023. O evento é considerado a maior feira de literatura do Norte e Nordeste brasileiro.

Com o tema Poéticas Afroindígenas no Bicentenário da Independência do Brasil na Bahia, coordenação geral do museólogo Jomar Lima (Cali – Cachoeira Literária) e coordenação executiva da jornalista Vanessa Dantas (Fundação Hansen Bahia), a Flica acontece, de amanhã a 29 de outubro, na histórica cidade de Cachoeira – encravada no Recôncavo Baiano, a cerca de 80 quilômetros  de Salvador.

“A realização deste evento permite que autores e leitores se encontrem e sintam a presença física uns dos outros, troquem e dividam experiências. Abre a possibilidade também para pequenos artistas, grupos, manifestações culturais e autores, promovendo mais visibilidade para a cultura, fomentando a economia do turismo e da literatura em Cachoeira”, informa Jomar Lima.

Em 2022, a Flica teve um público estimado de 80 mil pessoas, mas este ano a expectativa é a de que aumente em torno de 40%, segundo o coordenador. Ele diz ainda que o tema quer “celebrar os povos originários, negros, indígenas nas artes e na poética das pessoas que produzem outras histórias”.

Uma das propostas é promover reflexões que possam mesclar a literatura da Bahia com as mais diversas manifestações culturais e populares.

Mas a Flica quer também fomentar a cadeia produtiva do livro, da cultura, do turismo, da economia criativa/solidária, da sustentabilidade, entre outras vertentes.

Presença feminina

A escritora de ficção e tradutora Marilene Felinto, Luciany Aparecida, autora do livro de poemas Macala, Elisa Larkin Nascimento, mestre em direito e ciências sociais pela Universidade do Estado de Nova York, Auritha Tabajara, escritora, cordelista e contadora de histórias indígenas, e Cleidiana Ramos, colaboradora de A TARDE e doutora em antropologia, são algumas das participantes confirmadas para a feira.

Cleidiana diz que está extremamente honrada, mas que ao mesmo tempo se sente com uma responsabilidade enorme, já que irá mediar uma mesa estratégica não apenas pelo tema – A independência vestida de povo – Imagens e imaginário da Cabocla e do Caboclo – como também pela composição.

“Imagine mediar essa troca de informações e reflexões feitas por Mãe Valnizia Bianchi, ialorixá do Terreiro do Cobre, Mãe Thiffany Odara, do Terreiro Oya Matamba e o líder indígena Sairi Pataxó. São intelectuais com uma enorme potência de discurso, de manejo dos códigos de linguagem, mas sobretudo em diálogo com suas comunidadades tradicionais, que têm uma forma de expor sofisticados sistemas filosóficos”, detalha Cleidiana.

Quanto ao tema desta edição, a jornalista conta que achou genial a escolha de poder falar da independência da Bahia sob a perspectiva de quem a fez de fato. “Ter a oportunidade de ampliar essas novas potencialidades narrativas, com destaque para heroínas e heróis populares, coloca essa feira, que já é tão especial, em uma perspectiva cada vez mais interessante”.

Além das participantes já citadas, a Flica contará ainda com a poeta, relações públicas e produtora cultural Adriele do Carmo, Yacunã Tuxá, ativista indígena, LGBT+, artista visual, ilustradora e escritora, e Eliane Potiguara, a primeira mulher indígena a receber, no Brasil, o título de Doutora Honoris Causa.

Para Adriele, que participa da mesa Visibilidade e resistência: poéticas e políticas para a emancipação dos corpos e descolonização das mentes, o evento é um espaço muito importante e potente no que tange às diversas formas de se fazer literatura.

“Esta mesa, como toda a feira, reivindica esse lugar das escritas como um lugar de liberdade, emancipação e contestação do que está posto e de todo o sitema que padroniza pensamentos e coloniza ideias”, observa do Carmo.

A poeta acha fundamental que o tema deste ano coloque a voz do negro e do indígena em posição de destaque. “Tomando o lugar em que ela sempre deveria ter estado. Até pouquíssimo tempo atrás, nos festivais literários considerados de alto nível, era sempre colocada uma literatura canônica, branca e de um único olhar. Desta vez, a Flica traz a literatura que é do povo, feita pelo povo e que representa, de fato, as pessoas da Bahia”, acredita Adriele.

Espaços de convivência

Como novidades da 11ª edição, a festa criou o espaço Flica Audiovisual – realizada no Cine Theatro – com mesas de debates e lançamento de publicações, e a Casa dos Encontros Literários com programações de algumas editoras nacionais e internacionais.

Tem ainda a Casa do Patrimônio – local que reunirá conteúdos referentes ao patrimônio material e imaterial (Casa do Iphan); o Espaço Dannemann – com atividades de extensão, pela primeira vez, na cidade vizinha de São Félix; a Casa da Irmandade Nossa Senhora da Ajuda, com a  exposição dos acervos e publicações que marcaram a trajetória da editora Solisluna; e a Santa Casa Cultural – criada para lançamentos de livros, poesias, artes.

Além disso, tem a Casa Preta Hub, um espaço de apoio para artistas locais produzirem conteúdos para o universo digital, fotográfico e de som. E também a criação do espaço de coworking para co-criar e desenvolver negócios locais, promovendo um ecossistema diverso de economia colaborativa pautada nos temas da cultura afro.

A Flica 2023 é realizada pela Fundação Hansen Bahia (FHB) em parceria com a Cali – Cachoeira Literária. Conta com a parceria da TV Alba e da Prefeitura de Cachoeira. Tem como livraria oficial a LDM, e patrocínio da Acelen e Governo  do Estado da Bahia.

Da equipe de A TARDE, Cleidiana Ramos participa do evento no Recôncavo – 

Flica 2023 / Cachoeira – Ba / 26 a 29 de outubro / Gratuito