‘Tínhamos promessas que nunca se cumpriram’, diz representante de comerciantes sobre a Baixa dos Sapateiros

Para a Associação dos Lojistas da Baixa dos Sapateiros e Barroquinha (Albasa), local deixou de ser atrativo depois de tantas mudanças e perdeu vida

A Baixa dos Sapateiros está sem vida!’. É essa a opinião de alguém que viveu mais de 30 anos no lugar e viu uma das principais avenidas da cidade se transformar. Ruy Barbosa, 70 anos, chegou a ter oito lojas na região quando a Baixa era um dos principais centros comerciais da cidade. Depois de tantas transformações, o comerciante, que também é representante da  Associação dos Lojistas da Baixa dos Sapateiros e Barroquinha (Albasa), encerrou suas atividades em 2019, mas não perde a esperança de ver a rua viva de novo, e lembra. ‘Foram muitas promessas que não se concretizaram’. 

Ao longo dos anos, ele conta ter ouvido diversas promessas feitas pelo poder público para ajudar a Baixa. As ações iam de obras a mudanças de órgãos públicos para a região, mas nunca se tornaram realidade. Para Ruy, algumas das ideias poderiam realmente ajudar na revitalização da avenida. “Temos promessas de trazer órgãos públicos, prefeitura-bairro. Tínhamos a promessa do ex-prefeito ACM Neto de colocar na Barroquinha um cadastramento médico, que faria circular entre 4 e 5 mil pessoas, promessas de obras, como uma ligação entre o Campo da Pólvora e o Pelourinho, com uma passarela, era outro acesso interessante. Tudo isso foi falado mas não concretizado”, detalha ele.

Depois de quase 40 anos de trabalho na J,J Seabra, Barbosa lembra com detalhes das modificações que, na sua visão, colaboraram para fazer com que a famosa avenida perdesse muito do seu prestígio e movimento. Para o representante, tudo começou com modificações de transporte, mas a mobilidade não é a única culpada. “Na época da criação da Estação da Laṕa muitas linhas de ônibus foram deslocadas para lá, esvaziando a Estação da Barroquinha, não tinha necessidade disso. Nos últimos anos, com o metrô, isso se intensificou. A gente tinha órgãos públicos também, como o NAJ, no Shopping Baixa dos Sapateiros, que foi retirado. Tudo isso colabora para esvaziar”, acredita o representante. 

Barbosa lembra que quando chegou, nos anos 80, circulavam na região cerca de 150 ônibus por hora, número que foi sendo reduzido ao longo dos anos. De 100 ônibus/hora em 1990, o número passou para 60 em 2012. “Hoje não devemos ter nem trinta”, diz ele. A mudança, no entanto, não se restringe ao transporte público: a quantidade de lojas também se transformou. Da década de 80 até os dias de hoje, toda região da Baixa dos Sapateiros, que já chegou a contar com quase 800 lojas, foi esvaziando para ter, atualmente, cerca de 250 estabelecimentos ativos, segundo o representante.

Mobilidade não é tudo

O representante da Albasa, no entanto, defende que não adianta apenas mexer no esquema de transporte sem modificar outros detalhes importantes da região. “Não temos morada, um escritório de advocacia, uma clínica médica, um consultório de dentista. A parte de cima não tem vida. É diferente da Avenida Sete, por exemplo. Precisamos trazer gente, ocupar os espaços, colocar órgãos públicos, serviços. Não é só o ônibus, precisa de uma motivação, se não a pessoa vai para lá para que?”, pergunta.

Questionada sobre a região, a prefeitura de Salvador se posicionou através de nota enviada para a última edição do Jornal da Metrópole. No texto, a gestão municipal reconhece tanto a importância quanto a degradação do espaço. “A Baixa dos Sapateiros é uma importante região para Salvador, dentro da história, cultura e costumes do Centro Histórico e que, durante as últimas décadas, veio sofrendo um forte processo de degradação”, diz a nota, que ainda destaca ações como a requalificação do Camelódromo,  reconstrução do Mercado de São Miguel, entregue no ano passado e a requalificação da escadaria da Barroquinha, dentre outras intervenções.

Para o futuro, a gestão municipal diz que está nos planos a requalificação de outro terminal da região – o da Barroquinha já está em obras que devem ser concluídas esse ano. “Um dos próximos passos é a requalificação do Terminal do Aquidabã, cujo projeto está sendo elaborado pela Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF), com estimativa de ser iniciada ainda este ano e que deverá transformar o local em uma grande área de lazer e convivência”, diz o texto. Segundo a prefeitura, todas as intervenções fazem parte do programa Salvador 360, eixo Centro Histórico, com investimento municipal de cerca de R$300 milhões para a região.

Na memória de Ruy, as lembranças guardadas com carinho e a esperança de dias melhores para a Baixa. “Formei um advogado, uma fisioterapeuta trabalhando lá na Baixa dos Sapateiros. Se não tivesse caído como caiu era provável que ainda estivesse lá. A gente abria a loja, colocava um tabuleiro na frente, e duas horas depois tinha que repor a mercadoria. Não dava nem pra acreditar”