O sistema de saúde do Amazonas é hoje o retrato do que pode haver de mais assustador, até o momento, entre as consequências da pandemia do coronavírus. Por falta de vagas e de pessoal, os hospitais não conseguem atender todos os pacientes.
Dona Maria das Graças tinha 63 anos. Estava internada desde a quinta-feira (16) no pronto-socorro São Raimundo. Segundo a família, ela chegou com sintomas da Covid-19 e foi piorando. Estava inconsciente e respirava com dificuldade. “Só tem um respirador aí sendo usado por outra pessoa”, relata Cintia Maria, filha.
Desde sexta-feira (17), a família esperava que ela fosse transferida para uma UTI. Chegou a conseguir nesta segunda (20) na Justiça a garantia de transferência, mas não adiantou. Dona Maria das Graças morreu no fim da tarde.
A angústia das famílias não é só por causa da falta da vagas para casos da Covid-19. No pronto-socorro e hospital Platão Araújo, Rosete estava desesperada. O marido sofreu um acidente grave de moto. E, 12 horas depois, ainda não tinha conseguido ser transferido para uma UTI.
“Ele está entubado e até agora não me dão resposta de nada”, disse chorando.
“E o que que eles estão esperando ?”, perguntou a reportagem.
“Um leito lá no João Lúcio para operar ele. Faz muito tempo e quanto mais tempo passar é pior para ele”, disse Rosete.
O governo do estado já declarou que o sistema de saúde do Amazonas está entrando em colapso pela falta de pessoal de saúde e pela ocupação dos leitos. O hospital Delphina Aziz, em Manaus, é referência no tratamento da doença e está lotado. Os três hospitais de apoio na cidade também. E os prontos-socorros só atendem apenas casos considerados muito graves.
E os números do estado continuam subindo. Já são mais de 2 mil casos e quase 190 mortes.
Ontem, um a um, familiares foram no cemitério do Tarumã, na Zona Oeste, para se despedir do técnico de enfermagem Francisco Fredson da Silva. Ele morreu depois de 20 dias internado. A familia acredita que ele foi infectado em um dos dois hospitais de apoio onde trabalhava. O enterro foi numa área exclusiva para mortos por Covid-19.
“A última vez que eu vi foi quando ele foi entubado no dia 31 e a partir daí eu nunca mais o vi. Está todo mundo muito sentido, não é só eu, até as pessoas que não viram, que eram, amigos próximos”, conta Arissa Raquel, filha.
O hospital de campanha montado exclusivamente para receber pacientes com a Covid-19 está funcionando desde sábado com 50 leitos clínicos e 16 UTIs. Pode chegar a 400 leitos. O Ministério Público de Contas investiga se houve superfaturamento na compra de 28 respiradores. Enquanto o governo federal pagou R$ 57 mil por cada aparelho, o Amazonas gastou R$ 106 mil pelo mesmo equipamento.
O vice-presidente Hamilton Mourão se reuniu com o governador Wilson Lima, PSC, e o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, PSDB, para discutir medidas contra o coronavírus, mas saiu sem dar entrevistas.