A volta para casa de gêmeas siamesas após cirurgias de separação

Safa e Marwa, de 3 anos e meio, foram submetidas a três grandes operações, passando mais de 50 horas em cirurgia.

Duas meninas gêmeas que nasceram unidas pela cabeça e foram separadas com sucesso no ano passado por uma equipe do Hospital Great Ormond Street, em Londres, voltaram para casa no Paquistão nesta semana.

Safa e Marwa Bibi, de 3 anos e meio, foram submetidas a três grandes operações, passando mais de 50 horas em cirurgia.

A mãe delas, Zainab Bibi, disse à BBC que estava muito satisfeita em finalmente levá-las de volta para casa para ficar com resto da família.

“As meninas estão muito bem. Marwa fez um bom progresso e só precisa de um pouco de apoio”, disse ela.

“Vamos ficar de olho em Safa e cuidar bem dela. Se Deus quiser, as duas logo vão começar a andar.”

Foi necessária uma equipe de 100 pessoas do hospital londrino para cuidar do caso das irmãs paquistanesas. Além de cirurgiões e enfermeiras, a equipe envolvida no cuidado e separação das gêmeas inclui bioengenheiros, modeladores 3D e um designer de realidade virtual.

As gêmeas foram levadas a Londres para serem operadas — Foto: BBC

As gêmeas foram levadas a Londres para serem operadas — Foto: BBC

As gêmeas foram separadas em fevereiro de 2019 e, desde então, moram com a mãe e o tio em Londres. Todos os seus custos médicos e de estadia — mais de 1 milhão de libras — foram pagos por um doador, o empresário paquistanês Murtaza Lakhani.

Gêmeos siameses desenvolvem-se a partir de um único óvulo fertilizado e, portanto, são sempre idênticos e, mais frequentemente, conectados pelo peito, abdômen ou pelve.

Gêmeos siameses são raros e casos em que eles são unidos pela cabeça são mais raros ainda. Apenas um em cada 20 casos de gêmeos siameses a união é pela cabeça, com o crânio de ambos fundido — caso conhecido como gêmeos craniópagos. A grande maioria não sobrevive à infância.

Existem duas teorias sobre por que são unidos. Ou a divisão em dois embriões acontece mais tarde do que o habitual, e os gêmeos se dividem apenas parcialmente ou, após a separação, partes dos embriões permanecem em contato e essas partes do corpo se fundem à medida que crescem.

A batalha para separar Safa e Marwa

As meninas, agora com três anos e meio, fazem fisioterapia regular para tentar melhorar sua mobilidade. Ambas têm dificuldades de aprendizagem.

A mãe chama a equipe cirúrgica de “heróis” e diz que seus outros sete filhos no Paquistão estão ansiosos para ajudar a cuidar de Safa e Marwa.

O cirurgião-chefe, Owase Jeelani, disse à BBC que ele e a equipe estavam “muito satisfeitos” pela família, mas que ainda tinha algumas dúvidas sobre o resultado.

“Acho que Marwa se saiu muito bem e continua fazendo grandes progressos. Quando olho para toda a família, sim, provavelmente foi a coisa certa a fazer. Mas para Safa como indivíduo, não tenho tanta certeza.”

Neurocirurgião extremamente experiente, Jeelani ainda tem preocupações com as consequências da escolha quase impossível que ele e sua equipe tiveram de fazer na sala de cirurgia.

A difícil decisão do cirurgião

A fisiologia específica de Safa e Marwa apresentou um conjunto único de desafios para a equipe médica. As meninas era unidas pelo topo de suas cabeças, voltadas para direções opostas. Eles nunca tinham visto os rostos uma do outra.

Safa e Marwa voltaram com a mãe para morar com o resto da família no Paquistão — Foto: BBC

Safa e Marwa voltaram com a mãe para morar com o resto da família no Paquistão — Foto: BBC

As gêmeas tinham um labirinto de vasos sanguíneos compartilhados que nutriam os cérebros de ambas. Apenas uma delas poderia receber alguns dos principais vasos sanguíneos. Estes foram dados a Marwa, que era a gêmea mais fraca.

Mas, como resultado, Safa teve um derrame. Ela agora tem danos permanentes no cérebro e pode nunca conseguir andar.

Jeelani disse que essa questão estará para sempre com ele. “É uma decisão que tomei como cirurgião. É uma decisão que tomamos como equipe. É uma decisão com a qual temos que conviver”, conta.

Ele acredita que o resultado para Safa e Marwa provavelmente teria sido melhor se elas tivessem sido separadas antes. A família demorou bastante tempo para levantar os fundos necessários para pagar os custos cirúrgicos.

Isso levou Jeelani e seu colega cirurgião David Dunaway, a criarem uma instituição de caridade para tentar aumentar a conscientização e obter dinheiro para cobrir os custos de separação de gêmeos craniópagos.

Em janeiro de 2020, a mesma equipe cirúrgica do hospital separou com sucesso meninos gêmeos da Turquia que eram unidos pela cabeça: Yigit e Derman Evrensel.

Eles também passaram por três operações, mas o processo foi muito mais rápido do que com Safa e Marwa. Os gêmeos voltaram para casa, na Turquia, antes de seu segundo aniversário, e os cirurgiões acreditam que eles terão um progresso muito rápido.

Recuperação

A recuperação das duas meninas foi lenta — elas só tiveram alta do hospital cinco meses depois de separadas, e mesmo assim continuaram em Londres para os tratamentos e exames posteriores.

Elas precisaram de fisioterapia diariamente para ajudá-las a alcançar alguns marcos fundamentais — aprender a rolar, a sentar e a manter a cabeça erguida. Ambas também precisaram de enxertos de pele na parte de trás de suas cabeças.

A mão das meninas disse à BBC, no ano passado, que estava segura de que separar as meninas foi o correto a fazer.

“Estou muito feliz. Com a graça de Deus, posso segurar uma por uma hora e, depois, a outra. Deus respondeu às nossas orações”, disse ela. Foto: Safa e Marwa tiveram alta do hospital cinco meses após a cirurgia, mas continuaram morando em Londres por um tempo — Foto: BBC. Globo G1.